Cultura, produto humano!
A cultura não pode ser reduzida a mero produto do acaso, não é relativa. A vida natural traz consigo possibilidades, ideias e visões de mundo que podem se completar, como podem entrar em conflito. Por isso o autor Leonel Franca chama essa ideia errônea que se tem da cultura de “Um campo baldio onde crescem em desordem cardos e ervas venenosas…” (1ª edição – A Crise do mundo moderno. Editora Ecclesiae. p.34). Mas então, como entender a cultura de forma justa? Leonel Franca nos ajuda: “a cultura é obra do homem”. Devemos ter bem claro que a cultura depende do homem. Franca continua: “O mesmo campo esmoitado, irrigado, a desentranhar-se em árvores frutíferas ou messes lourejantes, é uma terra CULTIVADA”.
Cultura é uma ação propriamente humana. Não podemos cair no erro de achar que a cultura “molda” o nosso ser, porque a verdade é que nós deveríamos moldar a cultura. Vivemos em tempos confusos, onde a definição das coisas facilmente cai no esquecimento ou continua na ignorância. A cultura é uma atividade que depende de como o ser humano se desenvolverá, ou melhor, se atualizará (ou não) para viver plenamente a realidade natural. Crer que não podemos transformar a cultura em que vivemos e que esta é intocável, consiste em permanecer com uma visão reduzida da realidade.
“O homem ‘cultivado’ é o que desenvolveu as suas capacidades originais; o primitivo ou bárbaro, aquele que as deixou, ou quase, em estado bruto e inativo. Entre nós é principalmente à valorização dos bens de ordem espiritual que com mais propriedade se aplica o termo. Ultimamente, violentando lhe um tanto o significado histórico, foi também ele aplicado ao desenvolvimento do corpo” (FRANCA, 1927). Deste modo, deve estar claro que a cultura não se reduz ao campo da subjetividade e relatividade. A Cultura possui uma definição, estando intimamente associada ao cultivo e desenvolvimento da atividade e inteligência humana.
Se cultura tem a ver com cultivar, então embora o homem possa tirar de si para oferecer à cultura, ele não é suficiente. Não encontramos recursos suficientes em nós mesmos para dizer que somos capazes de produzir cultura. Deste modo, é evidente que o homem necessita do passado. Mergulhados como estamos na mentalidade autossuficiente e individualista, muitos pensam que o passado não serve mais, que tudo que os antepassados pensaram, fizeram e o modo que viveram é ultrapassado e não nos cabe mais. Porém, nos diz Leonel Franca:
“A cultura é um patrimônio social, que se foi lentamente constituindo com os esforços árduos de antepassados numerosos; que se regenera e enriquece de contínuo com a colaboração do presente; que se transmite como herança viva para levar às construções do futuro a contribuição do passado, numa solidariedade indestrutível e benfazeja entre as gerações que se sucedem”.
É tolice pensar que ao resguardar as tradições e concepções clássicas estamos sendo impedidos de viver o agora com criatividade e novidade. A verdade é que os antigos nos deixam uma lição do que não fazer e assim podemos caminhar mais depressa e obter resultados muito melhores. “Nesta comunhão de modos de pensar, de querer e de agir, nesta síntese de valores acumulados pelo esforço do homem no intento de dar à vida expansão, ordem, beleza e estilo, vive a alma de um povo; concretiza-se o fruto de todos os esforços ascensionais, despendidos nos séculos de sua existência; reflete-se a fisionomia de sua individualidade histórica que se multiplica nos traços dominantes dos seus membros” (FRANCA, 1927). Esse acúmulo de conhecimentos permite que o solo da sociedade seja muito mais fértil e nessa analogia com o cultivo, a cultura possa realmente existir, como máquina do tempo que nos leva ao passado e nos permite vislumbrar um futuro melhor. Só assim seremos capazes de construir um hoje mais digno da pessoa humana.
Sabendo que a cultura não é relativa e que está intimamente ligada a tradição, pensemos: seu campo de atuação é vasto e subjetivo? A resposta é: não! A cultura pode e deve ser dividida em três grandes setores e dentro destes três elementos, compreendemos mais claramente o que é cultura.
1º – A Ciência – “Se a cultura importa enriquecimento e dilatação de vida, a ciência alarga-nos indefinidamente os horizontes. Se a cultura implica ajustamento ao meio, domínio conquistado sobre as forças cósmicas, a ciência dá-nos a chave desta adaptação vitoriosa” (FRANCA, 1927).
2º – A técnica – “Com as técnicas entramos no domínio da prática realizadora. Se a técnica se pode definir uma aplicação das descobertas científicas à organização material da sociedade, o seu contínuo desenvolvimento é o corolário espontâneo da natureza intelectual do homem” (FRANCA, 1927).
3º – A Arte – “A arte corresponde a outras exigências e preenche finalidades diversas. Para a nossa sede de emoção, para as aspirações imprecisas, mas poderosas do sentimento, ela cria-nos um mundo ideal de beleza (…) Através da arte, o mundo, na diversidade de seus elementos, reconquista a sua unidade profunda que a minúcia da análise científica fragmenta e o utilitarismo das técnicas econômicas degrada.
Como expressão superior de estados da alma e como veículo dos mais altos valores humanos, a arte é fator essencial de civilização e representa, em cada síntese cultural, um dos elementos mais característicos” (FRANCA, 1927). Deste modo, fica evidente que a cultura, além de possuir uma definição muito própria, também envolve elementos específicos e bem definidos que não podem ser ignorados.
@prof.pedrorossi
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3 Comentários
8ymq2t
Obrigada Bruna. Volte sempre.
Excelente artigo, muitos pontos a se pensar.